O álcool é a “droga legal” mais consumida pela população na Espanha, de acordo com o Inquérito sobre Álcool e Drogas (EDADES 2022) realizado à população dos 15 aos 64 anos. Além disso, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de 2018, as pessoas que bebem regularmente são duas vezes mais homens (uma em cada duas) do que mulheres (uma em quatro). A Pesquisa sobre o uso de drogas no ensino médio na Espanha (ESTUDES 2021) indicou que a idade de início do consumo é de 14 anos (em homens e mulheres), além disso, 71% dos jovens entre 14 e 18 anos o usaram em no último ano (68% nos homens e 73% nas mulheres).
Os efeitos do álcool na saúde física e mental são bem conhecidos, mas um dos órgãos que sofre os danos mais profundos é o cérebro. O álcool interfere nas vias de comunicação do cérebro – neurotransmissores – fazendo com que diminua sua eficácia e até limitando sua eficiência. Seu consumo contínuo envolve a destruição de células-tronco neurais, bem como a contração do tecido cerebral. No entanto, ainda faltam marcadores diagnósticos para caracterizar o dano cerebral induzido pelo álcool, especialmente quando ele é interrompido. O período de abstinência é crítico devido ao alto índice de recidiva que apresenta.
Em 2019, um trabalho conjunto do Instituto de Neurociências (CSIC-UMH), em Alicante, e do Instituto Central de Saúde Mental da Universidade de Heidelberg, na Alemanha, marcou um marco neste campo ao detectar, por ressonância magnética, que o dano que o álcool causa ao cérebro não para quando você para de beber, como até então pensado. Pelo contrário, eles continuam a progredir pelo menos nas primeiras seis semanas de abstinência.
O que impede é a toxicidade direta do álcool, mas não os efeitos sobre a substância branca do cérebro – aquela encontrada nos tecidos mais profundos (subcorticais) – O trabalho analisou uma amostra de 91 pacientes voluntários, com média de idade de 46 anos anos hospitalizados na Alemanha para tratamento de reabilitação devido a um transtorno relacionado ao uso de álcool. Para comparar as ressonâncias magnéticas cerebrais desses pacientes, foi utilizado um grupo controle sem problemas com a bebida, composto por 36 homens com idade média de 41 anos.
A hipótese considerada pelos pesquisadores, e posteriormente confirmada, era que a progressão do dano é mantida porque é acionado um processo inflamatório no cérebro que progride mesmo na ausência de álcool.
Mecanismo de vício desconhecido
Outra descoberta que ocorreu em 2020 foi que a capacidade viciante do álcool aumenta ao alterar a geometria da massa cinzenta do cérebro– A pessoa encarregada de processar a informação. Isso foi evidenciado por um estudo realizado em ratos e humanos publicado na revista científica Science Advances.
O trabalho, coordenado pelos investigadores Santiago Canals, do Instituto de Neurociências (IN-CSIC-UMH), centro conjunto do Conselho Superior de Investigação Científica (CSIC) e da Universidade Miguel Hernandez, e Wolfgang Sommer, do Instituto Central de Saúde Mental da Universidade de Heidelberg (Alemanha), propôs um até então desconhecido mecanismo de dependência de álcool.
Ele mostrou que os responsáveis pela mudança na geometria do espaço extracelular da substância cinzenta – formado pelos buracos e canais que deixam os corpos celulares livres e ocupados por líquidos e proteínas – foram os células do sistema imunológico que residem no cérebro, chamadas microglia.
Álcool, como uma substância nociva ativa essas células de defesa, que mudam sua forma e características bioquímicas. Essa ativação altera a geometria do espaço extracelular e possibilita vias de difusão de substâncias que, na ausência do álcool, seriam limitadas. “O próximo passo é descobrir se esse efeito é produzido diretamente pela ação do álcool na micróglia ou indiretamente por intermediários, como o fígado ou a microbiota intestinal”, explicou Casals.