“Você tem que ouvir os pacientes e dar a eles o tempo que eles merecem”

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O reitor de Medicina do CEU é especialista em Alergologia, reconhecido como “Acadêmico Correspondente” pela Real Academia Nacional de Medicina da Espanha e desde julho de 2020 membro da Comissão Permanente da Conferência dos Decanos das Faculdades de Medicina da Espanha. Por isso, conhece perfeitamente a necessidade urgente de uma mudança no SNS.

Mais de dois anos se passaram desde que a covid estourou. Quais são as duas lições que deveríamos ter aprendido?

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O SNS é constituído por profissionais de excelência que demonstraram as suas competências ao longo destes anos no combate a um vírus desconhecido, o SARS-CoV-2, responsável por uma pandemia de dimensões trágicas pelo número de infetados e mortos. Portanto, é relevante cuidar dos cuidadores. Uma das lições é a importância de ter uma liderança científica, técnica e profissional que una esforços e estratégias globais. O planeta está a ser atacado pelos nossos comportamentos: a desflorestação, o aquecimento global, a poluição dos mares e rios, o efeito de estufa, etc. Ou levamos muito a sério a saúde do planeta ou a humanidade estará fadada a sofrer novas pandemias.

Quanto ao futuro, face a uma população cada vez mais envelhecida e com mais comorbilidades, não se deveria criar uma figura de apoio para evitar erros?

Certamente precisamos fazer uma mudança de paradigma na área da saúde. Sem esquecer diagnósticos e tratamentos corretos, será fundamental promover a educação e prevenção em saúde. Um exemplo concreto: sendo as unidades coronárias essenciais para salvar vidas face aos enfartes agudos do miocárdio, será sempre mais saudável evitar fumar, praticar exercício físico moderado adequado à idade, seguir uma dieta mediterrânica e reduzir o stress permanente.

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A telemedicina ou o atendimento remoto ao paciente veio para ficar?

Telemedicina significa literalmente “cura à distância” e talvez a definição da Organização Mundial de Saúde seja a mais acertada: “A prestação de cuidados de saúde, em que a distância é um factor crítico, por profissionais que recorrem às tecnologias de informação e comunicação em para o intercâmbio de dados para diagnósticos, indicação de tratamentos e prevenção de doenças e acidentes, bem como para a capacitação permanente dos profissionais de saúde e em atividades de pesquisa e avaliação, a fim de melhorar a saúde dos indivíduos e das comunidades em que vivem. Sem dúvida, a telemedicina, que já é utilizada nas Forças Armadas há décadas, veio para ficar.

Existe o risco de desumanizar ainda mais a relação médico-paciente com essas ferramentas?

Não só chegou a telemedicina, mas também as ciências ômicas (genômica, transcriptômica, proteômica ou metabolômica), o estudo do microbioma, o diagnóstico molecular, a inteligência artificial, o big data, o aprendizado de máquina, a bioinformática, a cirurgia robótica… Todos esses avanços nos trazem mais perto da Medicina de Precisão, mas não podemos perder a perspectiva. Devemos cuidar dos doentes, não apenas curar doenças. Nas faculdades estamos promovendo a ética e a comunicação como ferramentas essenciais para os futuros profissionais de saúde. Eu sempre insisto que você tem que olhar nos olhos dos pacientes, ouvi-los com atenção, dar-lhes o tempo que merecem e nos apresentar adequadamente. São simples atos humanos vigentes desde nosso “pai” científico Hipócrates de Cos (450 aC).

O impacto das novas tecnologias na qualidade do atendimento é sempre positivo se colocado em escala?

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É importante diferenciar eficácia, efetividade e eficiência da afetividade. Falamos cada vez mais de Medicina baseada em evidências científicas, mas não devemos esquecer a Medicina baseada na afetividade. A relação entre o doente e o profissional de saúde é um encontro entre uma pessoa com dor, medo, incerteza e outra pessoa que tem de tentar curar, e quando não é possível aliviar, consolar ou pelo menos acompanhar. Trata-se de promover a ciência sem esquecer o humanismo.

Você sempre tem mais ou menos alunos de Medicina?

Na Espanha existem mais de 40 escolas médicas e várias novas anunciadas para os próximos cursos. Desde a Conferência Nacional de Reitores de Faculdades de Medicina, há anos alertamos que não há substituição entre o corpo docente por questões de idade e credenciamento de ensino. Manifesta-se também no sentido de que hoje mais do que médicos, são necessários mais especialistas em determinadas especialidades: Pediatria ou Anestesiologia, para citar dois casos concretos. Seria muito importante ter um Cadastro de especialistas para planejar adequadamente as convocações do MIR a cada ano. Outro problema diferente é o da fuga de cérebros. Mais e mais ofertas são recebidas para nossos graduados de vários países europeus (França, Reino Unido, países nórdicos,…) e em breve dos Estados Unidos.

No caso da eutanásia, na Espanha 50% dos pacientes não recebem cuidados paliativos. Qual é a sua opinião sobre isso?

Da Comissão de Profissionalismo do Colégio de Médicos de Madrid manifestamo-nos no sentido da importância de promover os cuidados paliativos a todos os níveis: extra-hospitalar e intra-hospitalar. Existe uma Sociedade Científica de Cuidados Paliativos muito poderosa em Espanha, que indica nos seus estudos que é relevante reforçar os recursos humanos necessários nesta importante área de cuidados dado que existe uma ampla margem para melhoria dos cuidados no final fase da vida. Também nas faculdades de Medicina devemos incluir nos nossos planos de estudos conhecimentos suficientes nesta área assistencial.

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